sexta-feira, 12 de junho de 2009

O inferno é molhado - Relato nº 03

Nada como acordar às 05:30, com aquele alarme agradabilíssimo da Nokia, para começar a se aprontar e ir à faculdade fazer a prova daquela cadeira que você ainda "paga" pela manhã por duvidosa conveniência, e que você não estudou bulhufas.

Diferentemente do intervalo do Visa, o novo dia não está com o sol nascente (a aparência é de absoluta noite) e a chuva é barulhenta e provocadora de preguiças. Saliente-se: você não está de bom humor e deseja fazer tudo o que sempre fez, inclusive continuar seguindo as ruas que sempre seguiu.

Como dessa vez, devido a traumas passados, você saiu bem mais cedo que o comum (com o intuito de ler alguma coisa antes da prova), a tranquilidade é sua companheira de viagem, juntamente com os limpadores de para-brisa que estão ligados na penúltima velocidade.
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Dead leaves and the dirty ground when I know you're not around
Shiny tops and soda pops when I hear your lips make a sound

When I hear your lips make a sound

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Chegando à BR mal sinalizada, mal frequentada, craterada e conhecida por seus invasores inesperados que você ainda teima em utilizar como caminho, o temido engarrafamento começa a surgir. Caminhões de todos os tipos, ônibus, motos, carros que parecem recém-saídos de ferro-velhos, bicicletas e um dilúvio são os personagens daquela cena.

Mais à frente, o rio. Ou alagamento de estrada, a depender de sua raiva.

Após um sonoro e lento "FU-D**", você relembra o trauma passado há quase 3 meses e deseja o quanto antes sair daquela visão do inferno para chegar ao seu destino. Felizmente, após 15 minutos, o rio é cruzado e sua empreitada rumo ao teste continua normalmente...

...até a chegada às estreitas ruas próximas à faculdade.

Se o que antes era apenas a visão do inferno, desta feita era, de fato, aquele lugar.

Os personagens agora são: placas de carro boiando na correnteza (sim, correnteza); outros destes parados, fumaçando, com seus alertas ligados; o inalterado dilúvio e você, já parte daquilo, sobre um oceano marron-claro.

Após algumas arriscadas e temerosas manobras aquáticas, você encontra um caminho com o nível d'água mais baixo e, após mais meia hora, chega à faculdade, faltando pouco mais de 5 minutos para a prova começar.

Cadê a caneta que você já se habituou a deixar no console do carro porque sempre esquece de levar quando sai de casa? Algum ser que, por alguns minutos, teve sua morte desejada, certamente a tirou dali por algum motivo. Tudo (nada) bem. Alguns centavos depois, uma nova caneta e a ida para a prova que, surpreendentemente, viria a ser mais fácil do que você imaginava.
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Voltando, dessa vez com destino ao trabalho, você tem três opções de caminhos a seguir. Os dois primeiros, certamente, por experiência própria e de outras pessoas, bem como por alguns telejornais assistidos, estariam completamente impraticáveis com aquele incessante dilúvio. Por falta de opção, você segue para a BR mal sinalizada, mal frequentada, craterada, conhecida por seus invasores inesperados e que, agora, você conclui se tratar dum rio intermitente.

Confirmando suas previsões, o trânsito nela está, simples e cruamente, parado. Nada se mexe, a não ser a correnteza.

Diante disso, restam-lhe duas opções: enfrentar o rio, de novo, dessa vez com muito mais veículos para cruzá-lo e correndo o risco de levar a manhã inteira para isso, ou buscar de alguma maneira outro caminho. Você opta pela segunda.


Após seguir por outra BR, agora limpa, bem sinalizada, que leva para o interior do estado em que você vive e que não é, nem de longe, opção de caminho, você entra em ruelas, ladeiras, bairros conhecidos dos noticiários criminais e, finalmente, após quase meia hora, encontra um local conhecido já em outro município e, pouco mais de 40 minutos depois, consegue chegar inteiro ao trabalho, quase duas horas após ter deixado a faculdade. Com o dilúvio onipresente.
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Moral da história: o inferno não é quente. Ele deixa alguns veículos e cabeças esquentarem.

Lembrando, novamente, que isso é uma hipótese de ficção. Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência ou Lei de Murphy.